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A FILATELIA ESPECIALIZADA - Parte 1

Método de pesquisa e estudo

Estudo da Série Alegorias e Próceres da República – 1906/17
Parte 1

CRITÉRIOS PARA ESTUDOS DE SELOS POSTAIS BRASILEIROS


Por que estudar os selos postais brasileiros?

Esta pergunta não tem uma resposta genérica, já que são muitos e variados os motivos que levam ao estudo dos selos postais, desde o interesse puramente comercial até o interesse histórico-social. O colecionador que coleciona os selos em sua integralidade é conhecido como Colecionador Especializado. Esses dedicam boa parte do seu tempo a estudar milimetricamente os selos postais com as suas variantes e seus acidentes, além de estudar as épocas de circulação desses, o ambiente histórico e social, os costumes, entre muitos outros eventos. Nós iremos nos restringir apenas aos critérios de estudo e não alongaremos os motivos que levam a se estudar os selos postais.


Os critérios

Os critérios para o estudo dos selos postais brasileiros devem ser definidos de acordo com a linearidade do estudo.

O estudo linear facilita as pesquisas necessárias para que se possa determinar quais as rotas que o selo estudado tomou num período de tempo. Este critério permite conhecer os diversos eventos dentro do período pesquisado para que se determinem quais eventos externos influenciaram a rota temporal do selo estudado. Essa linearidade permite conhecer a data de lançamento, o tempo de circulação geral, os tipos de carimbos usados, o local geográfico em que mais ocorreram eventos relacionados a ele, o tempo de circulação geográfica, quais os diferentes tipos de materiais usados (p. ex., papel, tinta, picotagem, impressora, goma, etc), quais as diferentes variedades, curiosidades e acidentes existentes, os valores tarifários na época, entre muitos outros eventos possíveis.

Toda esta coleta de informações baseadas nos eventos temporais serve de critérios estritamente precisos para conhecer-se a história de cada selo estudado. E o principal resultado é “o papel que representou tal selo dentro da história filatélica e todos os seus detalhes físicos atribuídos”.


As variedades

Variedade é tudo aquilo que descaracteriza o selo tipo (a primeira emissão e impressão, de acordo com o edital no DOU 1) e que seja relativamente constante. Os selos que foram impressos primitivamente (1843~1920) 2 são mais propensos a variações diversas por vários motivos, desde papel diferente, em substituição a falta do original e por acidentes causados pelo impressor até as numerosas nuances de cor em um mesmo selo de características em acordo com o seu edital, decreto, portaria ou qualquer outro documento oficial que determinou quais deveriam ser suas características. Não se deve confundir “variedade” com “acidentes” de impressão/picotagem ou com acidentes técnicos, não causados pelo impressor ou finalizador do acabamento gráfico. As variedades devem ser encaradas como selos que têm várias reimpressões (ou impressões em várias máquinas impressoras diferentes ao mesmo tempo ou em tempos posteriores), determinadas por documento oficial alterando alguma característica do selo original, ou selo tipo. Por exemplo, o selo RHM 3 228 seria na verdade, uma variedade do selo RHM 216.


Os acidentes

Os acidentes gráficos são muito comuns, inclusive na impressão de selos e cédulas de dinheiro 4. Seja por falta de atenção do profissional que faz parte do grupo de desenvolvimento até a impressão final do selo ou por motivos alheios a esses profissionais, os acidentes causam uma descaracterização do selo tipo, do projeto original esperado. Um exemplo bastante comum é o acidente conhecido como pliê 5, que é a dobra natural do papel, causada quando da entrada do papel em máquina. Os selos argentinos de meados do Século XX, comumente sofriam esses acidentes a ponto de haver uma frase sarcástica sobre eles: “é mais difícil encontrar um selo argentino sem ‘pliê’ do que com ele”6. São muitos outros os acidentes, tantos quantos possíveis em um trabalho onde exista a mão de obra não automática. Com a tecnologia avançando a passos largos os acidentes diminuíram sobremaneira, sendo hoje bastante difícil encontrar um selo que o tenha sofrido.


As curiosidades

É bastante difícil definir o que são “curiosidades” sem se colocar um prisma que filtre a visão de cada colecionador. Para muitos os acidentes são curiosidades e para outros os acidentes são os erros causados naturalmente quando da impressão do selo. Ambos estão certos, dependendo da visão “colecionista” de cada um. Afinal nem todos filatelistas se especializam em colecionar todas as diferenças existentes em determinadas coleções temáticas (todas as coleções são temáticas, sem exceção). Dificilmente as curiosidades se repetem exatamente iguais em uma grande quantidade de selos.


A METODOLOGIA NO ESTUDO DE SELOS POSTAIS

Em qualquer estudo científico, a metodologia é o que define a qualidade do resultado final esperado. Com métodos criteriosos corretos, dificilmente irá se introduzir erros que comprometam as pesquisas e o próprio estudo. A metodologia no estudo de selos postais inclui uma ampla gama de pesquisas específicas e genéricas referentes ao assunto escolhido. Desde as referências bibliográficas até os ensaios destrutivos dos selos, mantendo-se o bom senso. Cada fase da pesquisa metodológica deve ser respeitada sob pena de se introduzir falsos resultados na conclusão do estudo. Por ser um tema muito especializado e pouco estudado durante todos os anos que se seguiram após o lançamento do primeiro selo postal, pouca literatura existe disponível para referências, principalmente as dos primórdios dos selos postais no Século XIX e menos ainda no Brasil. A bibliografia existente é bastante escassa e o que existe é de difícil acesso, principalmente porque as tiragens da literatura especializada eram pequenas, muitas cópias se perderam e outras estão nas mãos de poucos colecionadores e de alguns comerciantes que as vendem a peso de ouro. Diante disso podemos dizer sem medo de errar, aquela máxima, de que para estudar os selos postais brasileiros requer-se 10% de inspiração e 90% de transpiração.


Os métodos

Nesta seção explicaremos passo a passo os métodos básicos para se iniciar os estudos dos selos postais e as ferramentas necessárias. Cada etapa deve ser seguida a risca, sob pena de faltar elementos importantes para as conclusões de cada passo, interferindo assim, no resultado final. Falaremos desde a escolha do tema de estudo até os equipamentos e ferramentas necessárias para tal empreita. Sempre vale alertar que a escolha do tema é primordial para o bom termo do estudo proposto. Com a escolha de um tema que tem muita dificuldade em se conseguir informações básicas, e que demanda muitos anos de pesquisa, corre-se o risco de não se chegar ao final e, portanto, não ter a conclusão esperada. Um bom estudo não é embasado apenas em teses não provadas, mas sim em estudos consistentes e com ensaios robustos e de difícil questionamento quanto ao resultado final.

Detalhes fazem uma grande diferença quando estamos falando de metodologia de estudos científicos. Baseado nisso abordaremos cada detalhe necessário ao bom método de pesquisa de selos postais. As mãos e as roupas absolutamente limpas são imprescindíveis, já que qualquer elemento estranho pode interferir no resultado. Dê preferência a roupas escuras de cores frias e, se possível, use luvas cirúrgicas no manuseio de selos novos, principalmente com os do Século XIX e do Século XX (até meados de 1965) 7. As peças postais seladas 8 são de valor inestimável nos estudos filatélicos porque podem nos contar muito sobre as épocas de suas emissões, do ano de lançamento, do selo tipo original, da circulação, entre outros detalhes de suma importância. As peças postais servem também se estiverem em pequenos fragmentos, desde que com carimbos inteiros e legíveis. Abaixo mostraremos quais equipamentos e ferramentas auxiliares são necessárias ao estudo de selos postais. Mas antes faremos uma lista das diferenças básicas que se deve focar.

1ª Parte: Conhecendo as diferenças básicas

    Papel (tipo, espessura, cor, etc)
    Tipo da impressão (p. ex. Offset)
    Chapa (número; se retocada; se refeita; etc)
    Cor (número de cores; p. ex. policromia)
    Valor facial
    Estampa
    Formato (tamanho do selo; vertical x horizontal)
    Filigrana
    Fosforescência
    Denteação
    Tiragem
    Quantidade na folha
    Goma (com ou sem; tipo)
    Sobrecarga
    Reimpressão (quando conhecida)
    Especiais (tête-bêche; se-tenant; etc)
    Outras

Essas são as diferenças básicas. A partir de cada uma delas podemos descobrir todos os detalhes que nos interessam e assim formar todo o histórico do selo em estudo. Teremos um título dedicado a descrever cada item de forma mais detalhada. Esse é o primeiro passo.

2ª Parte: Equipamentos básicos

    Computador
    Monitor colorido de LED de alta qualidade é o ideal
    Programas gráficos e de texto (Photoshop; Corel Draw; PDF; Word; etc)
    Escâner (de boa qualidade; mínimo 600 DPI ótico)
    Mesa de luz (luz fria branca 120W; 50 x 40 x 15 cm; vidro sem distorções; etc)
    Mesa de trabalho (ampla; mín. 120 x 50 cm; etc)
    Luminária de foco dirigido (luz fria branca)
    Luminária de luz ultravioleta 9

3ª Parte: Ferramentas

    Pinça filatélica (de boa qualidade)
    Filigranoscópio
    Base de cor escura (de preferência cartão grosso preto: 350 gr/m²)
    Régua milimetrada de acrílico de 15 cm ou 20 cm
    Odontômetro com escala de 6~17
    Placa de vidro de 6 mm (35 x 25 cm)
    Micrômetro externo ~25 mm
    Estilete de faca grande
    Microscópio
    Lupa
    Conta-fio
    Régua de aço de 30 cm
    Óculos de proteção contra raios UV

4ª Parte: Itens auxiliares

    Vasilha para banhos
    Vasilha para lavar os selos
    Caixas para separação dos selos (ou outro objeto)
    Envelopes para guardar os selos separados
    Escala de cor com o padrão Europa
    Classificador para selos já estudados
    Álbum definitivo com as indicações dos selos estudados

Esta lista mostra o que é necessário basicamente para iniciar os estudos dos selos postais. Não se deve esquecer a literatura disponível, os estudos de outros filatelistas (principalmente os não publicados), as referências de fóruns, os clubes e associações filatélicos, grupos de Internet, etc. Os catálogos são absolutamente necessários, principalmente os do próprio país de origem do selo escolhido para o estudo. Mesmo os catálogos sendo considerados meras “listas de preços” dos comerciantes que o editam, traz alguma informação importante, principalmente com relação as datas das emissões e suas tiragens. Para ter esses dados de forma precisa, é necessário ter acesso aos editais e/ou outros documentos oficiais que tragam a informação integral de cada emissão. Os Correios, alguns museus e bibliotecas possuem um grande acervo de documentos oficiais das emissões filatélicas. É muito importante conversar com outros filatelistas, que colecionam o mesmo tema, pois eles podem ser de grande valia com informações pertinentes ao estudo proposto. O ideal é que se formem grupos de estudos, para facilitar a coleta e a tabulação dos resultados desejados. Pessoas que tenham o mesmo interesse e que estejam dispostas a pesquisar sobre o nascimento de um selo e a sua evolução, são muito desejáveis para não sobrecarregar apenas uma ou duas pessoas.

Para o estudo dos selos postais, é muito importante que o local escolhido para tal seja bem arejado, porém sem ventos fortes, seco, livre de poeira, temperatura amena e iluminação ideal. Uma tabela com os cálculos necessários à iluminação você encontrará na seção “Adendos”10. A iluminação ideal é imprescindível para o estudo de cores. Jamais use iluminação natural (Sol) 11 para o estudo de cores, nenhum selo foi produzido ao ar livre, portanto deve-se reproduzir o local o mais próximo possível de um local de impressão gráfica, em termos de iluminação.

Todo o equipamento e ferramentas sugeridos são de vital importância para um estudo sério dos selos postais brasileiros (bem como os de outros países), por isso mantenha-os sempre limpos, em locais próprios e que seja fácil lançar mão quando necessário. Nós utilizaremos algumas séries como exemplo de estudos e o faremos passo a passo.


1 Diário Oficial da União.
2 O primeiro selo postal foi lançado em 1840 pelo Reino Unido. O Brasil lançou o seu primeiro selo em 1843, o segundo no mundo de circulação nacional, os selos de 30, 60 e 90 Réis em uma única folha, da conhecida série “Olho de Boi”.
3 RHM é a abreviatura do nome do editor do Catálogo de Selos do Brasil, Rolph Herald Meyer, conhecido como Catálogo RHM, sendo o único catálogo exclusivamente de selos brasileiros e que atinge todas as emissões desde o primeiro selo, os Olhos de Boi, do Império brasileiro, até as últimas emissões. Até o ano de 2005, este catálogo era editado anualmente e em dois volumes a partir de 1991. Atualmente as suas edições não têm uma época definida para ser lançado. O editor atual é o sucessor e filho de Rolph Herald Meyer, Peter Meyer.
4 Atualmente os selos são impressos exclusivamente pela CMB – Casa da Moeda do Brasil, órgão oficial responsável pela produção de impressos de segurança. Esporadicamente são impressos em outras oficinas gráficas.
5 Palavra francesa que quer dizer dobra, em referência as dobras naturais do papel utilizado que podem ocorrer durante o processo de impressão dos selos e que formam uma prega como nas saias das mulheres.
6 Comentário muito utilizado em referência aos selos argentinos, principalmente os dos anos 40~70 do Século XX, tamanha era a quantidade desses selos com este acidente.
7 Selos do Império até a emissão conhecida como Bisneta.
8 Envelopes selados com os selos objetos do estudo. Muito difíceis de encontrar as peças dos selos clássicos do Brasil, que vão dos Olhos de Boi até os conhecidos como Alegorias Republicanas.
9 O ideal é mandar fazer esta luminária, já que é muito específica para selos. Veja a sugestão de um projeto na seção ADENDOS*.
10 A seção ADENDOS* inclui uma série de artigos técnicos sobre as condições ideais para o estudo de selos, bem como sobre composição das cores em impressões gráficas, tipos e gramaturas de papéis, tipos de tintas, resistência mecânica das tintas, denteações e outros artigos pertinentes.
11 A luz natural modifica as tonalidades das cores que foram fabricadas para uso interno, como é o caso dos selos postais. O livro, deste mesmo autor, Como as cores existem e se formam (em produção), trata em detalhes deste assunto.


*A seção Adendos ainda está em criação e será publicada assim que possível.

COPYRIGHT 2016 - BLOG SELOS ORDINÁRIOS DO BRASIL 1890 - 1993
AUTOR: Romeu Vanni de Natale
REVISÃO:  José Augusto Fonteque

2 comentários:

  1. Olá Adm,
    Esta excelente este início. Já respondeu a muitas das minhas dúvidas.
    Vamos fazer deste blog uma referência para nossos estudos.
    Valeu

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  2. Parabéns pelo texto. Muito esclarecedor!

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